quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Tolerância não é conivência


Tolerância não é conivência
Marco Milani

É, pois, um dever de todos os espíritas sinceros e devotados repudiar e desaprovar abertamente, em seu nome, os abusos de todo gênero que pudessem comprometê-la (Doutrina Espírita), a fim de não lhes assumir a responsabilidade. Pactuar com os abusos seria acumpliciar-se com eles e fornecer armas aos adversários.
Allan Kardec, Revista Espírita, jun/1865 – Nova tática dos adversários do Espiritismo

Se as imperfeições de uma pessoa só a ela prejudicam, nenhuma utilidade haverá em divulgá-las. Se, porém, podem acarretar prejuízo a terceiros, deve-se atender de preferência ao interesse do maior número. Segundo as circunstâncias, desmascarar a hipocrisia e a mentira pode constituir um dever, pois mais vale cair um homem do que virem muitos a ser suas vítimas. Em tal caso, deve-se pesar a soma das vantagens e dos inconvenientes.
São Luís (Paris, 1860). O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. X, item 21

A caridade mal compreendida faz com que o silêncio e a passividade prevaleçam diante de situações injustas e abusivas. Sob o pretexto da indulgência ou tolerância, uma palavra franca e amiga deixa de ser proferida e uma oportunidade de esclarecimento e auxílio ao próximo é desperdiçada. A inação faz com que o curso dos acontecimentos gere resultados muitas vezes indesejáveis e todo aquele que teve a opção de corrigir ou alertar sobre os equívocos praticados, mas optou pela omissão, também é responsável pelas respectivas consequências.
Ao estudarmos os princípios e valores doutrinários apresentados por Allan Kardec, começamos a compreender a cosmovisão espírita, a qual incentiva a busca por respostas racionais para todas as questões que afligem a humanidade, desde aquelas de caráter existencial que sempre inquietaram o homem (quem somos, de onde viemos e para onde iremos) até aquelas diretamente relacionadas às experiências individuais na vida cotidiana.
Ao contrário de religiões monolíticas, estabelecidas sobre verdades inquestionáveis, o Espiritismo estrutura-se sob a premissa da evolução das ideias mediante a comprovação dos fatos, unindo de maneira elegante e sóbria o conhecimento revelado pelos seres desencarnados com o conhecimento empírico. O dinamismo doutrinário espírita exige, entretanto, postura crítica e posicionamento coerente dos adeptos.
O comprometimento do espírita é, portanto, não somente com seu próprio desenvolvimento espiritual, obtido pelo aprimoramento de seus aspectos morais e intelectuais, mas também para com a própria doutrina que afirma professar, uma vez que se torna exemplo e referência.
Em nosso atual estágio evolutivo, ainda estamos todos aprendendo uns com os outros, sendo insensato se esperar a perfeição de alguém. Todavia, uma vez que estamos em relação direta com várias pessoas e temos a chance de auxiliar no esclarecimento doutrinário quando o objeto em discussão é o Espiritismo e seus princípios, é nosso dever praticar esse ato de caridade sempre que possível. O esclarecimento, naturalmente, deve ser baseado no respeito e desejo sincero de auxílio.
No centro espírita ou em qualquer ambiente de convivência (inclusive virtual), estamos em contato com pessoas de diferentes perfis e experiências de vida, mas todas supostamente têm em comum o elo doutrinário e a intenção de progresso espiritual. Ao nos depararmos com algum tipo de incorreção conceitual ou prática destoante dos princípios espíritas, cabe a nós verificarmos a melhor maneira de colaborar com o esclarecimento e superação dos problemas gerados pela situação. Bom senso, coerência e caridade devem estar acima da rispidez e humilhação. Da mesma maneira, o silêncio não deve ser usado caso outras pessoas possam ser prejudicadas por informações que gerem confusão ou posturas inadequadas, sob o risco da tolerância se converter em conivência.

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