A boa nova trazida pelo Espiritismo
Marco Milani
A palavra Evangelho (em grego, Euangelion), etimologicamente
é composta por dois elementos: Eu, que significa bom ou boa, e Angelion,
que significa mensagem ou notícia. Portanto, Evangelho significa boa notícia,
boa mensagem ou boa nova.
Na cultura cristã, Evangelho passou a ser utilizado
genericamente para designar a mensagem central trazida por Jesus, referente à
salvação do homem e ao Reino de Deus. A expressão “boa nova”, portanto, está
tradicionalmente associada ao Evangelho de Jesus, sendo entendida como uma
mensagem de esperança e um roteiro de conduta à humanidade.
As principais fontes históricas dos ensinos
cristãos sãos os Evangelhos cujas autorias são atribuídas a Mateus, Marcos,
Lucas e João, ainda que tais registros estejam sujeitos a questionamentos
críticos como a incerteza sobre a real origem e datação dos textos, a
confiabilidade das fontes utilizadas e algumas discrepâncias nos relatos. Além
disso, a influência das intenções teológicas dos autores e o contexto
sociocultural da época impactam a objetividade desses registros. A tradição
oral antes da escrita e a comparação com outras fontes históricas
contemporâneas também são analisados modernamente para avaliar a precisão e a
autenticidade dos relatos evangélicos.
Na perspectiva espírita, essa boa nova ganha uma
dimensão ampliada, pois o Espiritismo não só reafirma os ensinamentos morais de
Cristo, como também os reinterpreta à luz da razão e da ciência.
Apresentado ao mundo por Allan Kardec no século
XIX, o Espiritismo surgiu como um marco na evolução do pensamento filosófico, oferecendo
uma nova perspectiva sobre a “natureza, origem e destino dos Espíritos, assim como
suas relações com o mundo corporal”[1].
Sendo uma doutrina filosófica com consequências morais, Jesus foi apontado como
a referência máxima de conduta e, ainda, seus ensinamentos foram esclarecidos e
desenvolvidos sob novas luzes.
Ao propor uma visão mais abrangente do Evangelho, o
Espiritismo destaca a importância da evolução espiritual contínua, em
diferentes encarnações, bem como da responsabilidade individual perante a leis
divinas.
Uma das principais concepções da boa nova espírita
é a abordagem da preexistência e imortalidade da alma em um ambiente regido por
leis naturais perfeitas. Enquanto muitas filosofias e doutrinas apresentam a origem
do ser e a vida após a morte como mistérios ou dogmas inquestionáveis, o
Espiritismo as trata como uma realidade natural, passível de estudo e
compreensão. Por meio da mediunidade, fenômeno amplamente documentado e
estudado da doutrina espírita, é possível estabelecer valiosas comunicações com
os seres desencarnados, demonstrando a continuidade da vida além do corpo
físico e nutrir-se dos esclarecimentos proporcionados diretamente sob a ótica
espiritual. Esse entendimento não só alivia o medo da morte, mas também oferece
uma visão consoladora sobre o destino da alma, integralmente fundamentada na
justiça e bondade divina.
A reencarnação, como elemento central na boa nova
espírita, justifica o fato de que cada indivíduo vive múltiplas experiências
objetivando o seu progresso moral e intelectual. Com uma explicação lógica para
as desigualdades e sofrimentos humanos, o Espiritismo aponta a inúmeras
oportunidades de aprimoramento espiritual. Sendo o principal mecanismo da
justiça divina, em que cada ser depara-se com os resultados de suas escolhas,
acertadas ou não, o fenômeno reencarnatório reforça a ideia de responsabilidade
pessoal, como também promove uma visão otimista e evolutiva da existência, onde
as dificuldades enfrentadas na vida alinham-se a um propósito educativo e
transformador do ser.
Outro aspecto relevante da boa nova espírita é o
axioma de que todo efeito possui uma causa, vinculando as ações realizadas ou
intencionadas pelo indivíduo com as consequências, positivas ou negativas,
refletidas em sua vida atual ou em futuras encarnações. A compreensão desse
axioma estimula o desenvolvimento de uma consciência ética mais profunda, onde
a prática do bem se torna não apenas uma virtude, mas uma necessidade para a
construção de um futuro melhor.
A moral cristã, fundamentada na caridade, na
humildade e no perdão, é outro ponto fundamental da boa nova sob a perspectiva
espírita. No entanto, ultrapassa a simples adesão a esses princípios, propondo
uma aplicação prática e cotidiana. O Espiritismo incentiva o autoconhecimento e
o aperfeiçoamento constante do indivíduo pela prática do bem. Essa
transformação é essencial para o progresso espiritual e para a construção de
uma sociedade mais justa e fraterna. A caridade, em particular, é enfatizada no
ensino dos Espíritos como a base de todas as virtudes, sendo considerada o
verdadeiro caminho para a harmonia e a paz interior.
Ao promover valores como a liberdade e a
solidariedade, o Espiritismo alinha-se com as propostas que valorizam os
direitos individuais, as ações voluntárias humanistas e a liberdade de
consciência.
Por fim, é importante destacar a relação do
Espiritismo com a ciência, especificamente pelo pensamento crítico e racional
que lhe permite ressaltar um de seus pilares: a fé raciocinada. Ao contrário de
muitas linhas religiosas que veem a ciência como uma ameaça à fé, o Espiritismo
a considera uma aliada na busca pela verdade. Por meio do estudo dos fenômenos
mediúnicos e das investigações sobre a natureza da alma, o Espiritismo concilia
fé e razão, oferecendo uma visão coerente e integrada do universo. Essa
abordagem lógica permite que a doutrina espírita seja acessível a diferentes
públicos, independentemente de crenças religiosas ou culturais, promovendo um
diálogo aberto sobre as grandes questões da existência.
A boa nova trazida pelo Espiritismo representa,
sinteticamente, um avanço no conhecimento revigorando os valores cristãos,
condizentes com as necessidades e os desafios do mundo contemporâneo.
Combinando ética, ciência e espiritualidade, o Espiritismo oferece uma mensagem
de esperança e progresso para a humanidade, baseada na compreensão da pré-existência
e da imortalidade da alma, na reencarnação, no axioma de causa e efeito e na
prática do amor e da caridade. Essa nova visão do Evangelho, profundamente racional
e fraterna, se coloca como um farol para aqueles que buscam um sentido maior na
vida e um caminho para a evolução pessoal.
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