segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

Velha tática dos adversários do Espiritismo

 

Velha tática dos adversários do Espiritismo

 

Marco Milani

 

(Texto publicado na revista Dirigente Espírita, ed. 193, jan/fev 2023, p. 11-12)

 

               Em junho de 1865, Allan Kardec publicou na Revista Espírita o importante artigo “Nova tática dos adversários do Espiritismo”, no qual destacava o incômodo gerado por essa filosofia nascente que rompia com as carcomidas tradições religiosas firmadas sobre a fé cega e, principalmente, desmascarava o ilusório e alienante materialismo, declarando-o como o seu maior antagonista.

               Ao rapidamente disseminar suas ideias e angariar adeptos e simpatizantes em dezenas de países e em todas as camadas sociais, o Espiritismo enfrentou a forte resistência ególatra daqueles que viram suas convicções mais profundas sobre a realidade serem questionadas ou refutadas.

               Na ocasião, Kardec alertou que os adversários tentavam comprometer, ridicularizar e desacreditar a doutrina, semeando de forma sub-reptícia a divisão e lançando fachos de discórdia para fomentar a perturbação entre os adeptos e orientou:

 

É, pois, um dever de todos os espíritas sinceros e devotados repudiar e desautorizar abertamente, em seu nome, os abusos de todo gênero que pudessem comprometê-la, a fim de não lhes assumir a responsabilidade; pactuar com os abusos seria tornar-se cúmplice e fornecer armas aos nossos adversários.[1]

 

               Além de propostas sincréticas que tentavam misturar crendices e ideias místicas no ensino dos Espíritos, outras questões poderiam servir de munição aos detratores. Uma delas era a tentativa de impor uma roupagem partidária à doutrina espírita, como se o Espiritismo pudesse ser reduzido a um apêndice de ideologias políticas ou regimes em voga.

               Na Revista Espírita de fevereiro de 1863 são relatados diversos ataques proferidos por sacerdotes católicos durante seus sermões, acusando o Espiritismo de pregar a desunião da família, o adultério, o aborto e o comunismo. Sobre esses fatos, Kardec comenta a insensatez desses detratores de imputarem à doutrina espírita o que ela, justamente, prega o oposto.[2]

               Kardec afirmou que bastava o estudo sério do Espiritismo para refutar tais acusações e ainda destacou: “Quem poderá crer que pregamos o comunismo depois das instruções dadas a respeito no discurso publicado in extenso no relatório de nossa viagem em 1862?”[3]

               Na referida viagem, Kardec dirigiu-se aos operários lioneses citando uma esclarecedora e objetiva mensagem mediúnica de Erasto sobre o engodo materialista expresso em propostas utópicas e totalitárias.

 

Acabo de pronunciar a palavra igualitária. Julgo útil nela deter-me um pouco, porque não vimos pregar, em vosso meio, utopias impraticáveis, pois, ao contrário, repelimos energicamente tudo quanto pareça ligar-se às prescrições de um comunismo antissocial. Antes de tudo, somos essencialmente propagandistas da liberdade individual, indispensável ao desenvolvimento dos encarnados. Consequentemente, somos inimigos declarados de tudo quanto se aproxime dessas legislações conventuais, que aniquilam brutalmente os indivíduos. Embora me dirija a um auditório em parte composto de artífices e proletários, sei que suas consciências, esclarecidas pelas radiações da verdade espírita, já repeliram todo contato com as teorias antissociais dadas com apoio da palavra igualdade.[4]

 

               Em oposição ao que alguns poderiam supor, por má-fé ou ignorância, Kardec nunca isentou-se de enfatizar a participação ativa do espírita nos rumos da sociedade, contribuindo para a melhoria das relações humanas, mas nunca prescreveu cartilhas partidárias ou ideológicas para o exercício espontâneo da solidariedade e fraternidade. O alerta sobre as ideologias totalitárias serviu de orientação sobre os direitos e as escolhas individuais, valorizando o livre-arbítrio e a liberdade de consciência.

               Nas reuniões regulares da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas sentavam-se, lado a lado, monarquistas, liberais e socialistas e o que os unia era o mesmo ideal espírita. As discordâncias e discussões apaixonadas sobre os modelos para se dirigir e melhorar a sociedade não eram pautas a serem debatidas por seus simpatizantes diante do ideal maior da união fraterna entre todos, indistintamente. Sobre essa questão, Kardec assim se posiciona:

 

Devo ainda assinalar-vos outra tática dos nossos adversários, a de procurar comprometer os espíritas, induzindo-os a se afastarem do verdadeiro objetivo da doutrina, que é o da moral, para abordarem questões que não são de sua alçada e que, a justo título, poderiam despertar suscetibilidades e desconfianças. Não vos deixeis cair nessa armadilha; afastai cuidadosamente de vossas reuniões tudo quanto se refere à política e a questões irritantes; a tal respeito, as discussões apenas suscitarão embaraços, enquanto ninguém terá nada a objetar à moral, quanto esta for boa.[5]

 

               Quase 160 anos depois, a tática dos adversários do Espiritismo envelheceu, mas não se alterou. Adaptando-se ao progresso tecnológico, os detratores continuam a tentar desacreditar a doutrina e fomentar cizânia entre os espíritas.

               A disseminação de práticas sincréticas, informações supersticiosas e místicas, além do recrudescimento de infiltrações de caráter político-ideológico são recorrentes e exigem dos adeptos conscientes a aplicação da fé raciocinada para separar o joio do trigo e repudiar abertamente essas deturpações que não possuem nada de novo em sua essência.

 

 

Fonte:    https://usesp.org.br/wp-content/uploads/2023/01/DE193.pdf

 

 



[1] Revista Espírita, junho/1865. Nova tática dos adversários do Espiritismo.

[3] Idem.

[4] Revista Espírita, outubro/1861. Epístola de Erasto aos Espíritas Lioneses.

[5] Revista Espírita, fevereiro/1862. Resposta à mensagem de ano novo dos Espíritas lioneses.


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