sábado, 13 de setembro de 2025

As características do verdadeiro espírita

 

As características do verdadeiro espírita

 

Marco Milani

 

Texto publicado na Revista Dirigente Espírita, n.208, set/out 2025, p. 35-36

 

No capítulo XVII, item 4 de O Evangelho segundo o Espiritismo, Allan Kardec oferece uma das mais conhecidas definições do que é ser um verdadeiro espírita: “Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más.” Essa afirmação tem servido de referência para reflexões, estudos e práticas no movimento espírita. No entanto, é comum que se destaque apenas a parte final da frase, ignorando os elementos que a antecedem e que dão sentido pleno à caracterização feita por Kardec.

Uma leitura atenta do trecho mostra que essa identificação não se dá de forma puramente comportamental, mas parte da compreensão dos princípios doutrinários, os quais produzem no indivíduo efeitos transformadores duradouros. O esforço pela melhoria moral, embora essencial, não basta para definir o verdadeiro espírita se estiver dissociado do conhecimento e da adesão consciente aos fundamentos do Espiritismo.

Kardec inicia o trecho afirmando que o verdadeiro espírita “se acha em grau superior de adiantamento moral” e que “o Espírito, que nele domina de modo mais completo a matéria, dá-lhe uma percepção mais clara do futuro”. Ou seja, trata-se de alguém em que os valores do Espírito predominam sobre os impulsos materiais, e cuja sensibilidade espiritual é mais desenvolvida. Mas não se trata de uma superioridade estática ou inata: ela se revela pelo que o indivíduo compreende, acolhe e pratica. A chave dessa sensibilidade ampliada está na frase: “os princípios da doutrina lhe fazem vibrar fibras que nos outros se conservam inertes”. Isso significa que há uma afinidade íntima entre o Espírito que desperta e os ensinamentos espíritas, que não apenas o comovem intelectualmente, mas o tocam no sentimento, levando à fé inabalável.

Kardec reforça essa ideia com a metáfora do músico: “Um é qual músico que alguns acordes bastam para comover, ao passo que outro apenas ouve sons.” Essa imagem esclarece que não se trata apenas de escutar ou ler os ensinamentos doutrinários, mas de compreendê-los com profundidade e sentir suas implicações morais. Tal sensibilidade decorre de um progresso já alcançado e se manifesta no esforço consciente de transformação. Não basta, portanto, desejar ser melhor ou agir com boas intenções.

O verdadeiro espírita, portanto, é aquele que compreende os princípios do Espiritismo e se compromete com eles em sua vivência diária, mesmo diante das próprias imperfeições.

Desconsiderar essa dimensão doutrinária leva a um engano conceitual: considerar como espírita qualquer pessoa de boa vontade, independentemente das ideias que adote. Isso significaria, paradoxalmente, que fossem considerados espíritas sinceros indivíduos que defendem crenças, práticas e valores contrários ao Espiritismo, desde que aleguem boa intenção. Tal distorção é incompatível com a proposta kardequiana, pois o que caracteriza o verdadeiro espírita não é apenas a busca pelo bem, mesmo essa sendo fundamental, mas a busca orientada pelos princípios da doutrina.

O Espiritismo, sendo uma doutrina de consequências morais, não propõe uma conduta descolada de seu corpo filosófico e científico. Ele oferece uma concepção racional da vida e do destino da alma, que orienta e dá sentido às escolhas morais. Kardec deixa claro que a transformação moral é fruto da assimilação consciente e profunda dessas verdades, e não de um moralismo voluntarista ou emocional. Por isso, o verdadeiro espírita é “tocado no coração” pelos princípios da doutrina, o que significa que sua fé é iluminada pela razão, mas sustentada pelo sentimento.

Adotar o Espiritismo apenas como uma filosofia moral desprovida de fundamentos doutrinários é reduzi-lo a um humanismo espiritual genérico, dissolvendo sua identidade e confundindo seus objetivos. A consequência disso é que qualquer movimento ou corrente que proponha uma ética altruísta poderia ser considerado espírita, ainda que negue a reencarnação, a comunicabilidade dos Espíritos ou a existência de Deus, o que seria, evidentemente, um contrassenso.

O critério proposto por Kardec é claro: o verdadeiro espírita é aquele que, tocado pelos princípios doutrinários, esforça-se conscientemente por domar suas más inclinações, iluminado por uma fé raciocinada que lhe amplia o horizonte espiritual. Essa identificação não é feita por rótulo, prática exterior ou aparência de bondade, mas por coerência entre pensamento, sentimento e ação, enraizados no conhecimento dos fundamentos espíritas.

A moral espírita é inseparável de sua filosofia e de sua ciência. A transformação moral não é um fenômeno espontâneo ou místico, mas o resultado de um processo consciente de educação e prática da caridade. É esse o caminho que o Espiritismo propõe, e é por ele que se reconhece, de fato, o espírita verdadeiro e sincero.

 



terça-feira, 9 de setembro de 2025

Um rumo possível do movimento espírita


Um rumo possível do movimento espírita

 

Marco Milani

 

Texto publicado na Revista Dirigente Espírita, n.208, set/out 2025, p. 13-14

 

Recentemente, a desencarnação do conhecido médium baiano, Divaldo Pereira Franco, suscitou diferentes reflexões sobre as características culturais do movimento espírita brasileiro. Além de se reconhecer a sua profícua divulgação do Espiritismo, constata-se que ele foi o último dos grandes nomes cuja vasta produção mediúnica e eloquente oratória atravessaram as fronteiras nacionais e influenciaram os adeptos de dezenas de países. Tal produção é superada, apenas, pelo médium mineiro, Francisco Cândido Xavier, o qual foi, para muitos, o maior representante espírita brasileiro ao popularizar a doutrina a partir de meados do século XX.

Estudos sociológicos e antropológicos anteriores, como os de Hess (1991)[1], Stoll (1999)[2] e Lewgoy (2004)[3], já destacaram o papel central que médiuns carismáticos desempenharam na formação cultural do Espiritismo no Brasil, imprimindo elementos muito peculiares.

Desde a formação dos primeiros grupos mediúnicos espíritas brasileiros, no final do século XIX, existiram tensões comportamentais, principalmente quanto à postura desviante religiosista, conforme relatam Arribas (2008)[4] e Quintela (2010)[5], apontando o embate ideológico entre os chamados “místicos” e “científicos” no Rio de Janeiro, então capital do Império. Observou-se a tendência de se adotar um comportamento de tom venerativo em relação aos Espíritos comunicantes, priorizando sua identidade e suposta elevação moral em detrimento dos cuidados metodológicos da universalidade e da fé raciocinada.

Apesar de não ser o desejado, é compreensível que, ao ser disseminada para diferentes contextos geográficos e culturais, qualquer filosofia ou sistema de pensamento passe por um processo de ressignificação local. Essa “ambientação cultural” é objeto de estudo de diversas correntes das ciências sociais que observam como ideias universais são reinterpretadas conforme os códigos simbólicos, históricos e afetivos de cada sociedade. Geertz (1978)[6] destacou que não existe apropriação neutra de um corpo doutrinário: ele será necessariamente moldado por mediações simbólicas e práticas locais. No caso do Espiritismo, sua chegada ao Brasil encontrou um solo promissor para esse tipo de recriação, marcado por uma religiosidade popular influenciada pela tradição católica, pelo sincretismo e pela valorização da autoridade carismática, fatores que contribuíram para a configuração de um modelo devocional próprio, ainda que sustentado por referências formais à codificação original de Kardec.

Entretanto, se por um lado tais adaptações culturais são compreensíveis no processo de disseminação de qualquer doutrina, por outro é igualmente esperado que, com o tempo, haja um amadurecimento capaz de promover o retorno crítico e consciente às suas bases originárias. Assim como a fase adulta supera a juvenil não por negar sua história, mas por ressignificá-la com maior lucidez, também o movimento espírita pode evoluir superando formas de adesão baseadas no carisma individual ou na emoção devocional. Esse percurso não representa um retrocesso, mas um avanço no sentido da coerência doutrinária e da fidelidade reflexiva. O próprio Espiritismo, ao propor-se como o Consolador prometido, não anulou a mensagem de Jesus, mas a retomou em sua essência moral e racional, despida das deturpações dogmáticas acumuladas ao longo dos séculos. Trata-se de um exemplo claro de progresso intelectual e ético que, longe de repetir o passado, o eleva e o depura. Da mesma forma, a valorização consciente aos fundamentos kardequianos ao invés de posições opinativas de determinados médiuns e Espíritos deve representar para o movimento espírita não uma negação de sua história, mas a continuidade de seu propósito de iluminação das consciências com liberdade, responsabilidade e razão.

Esse amadurecimento pode se concretizar por meio de uma educação doutrinária mais vigorosa e estruturada, que vá além da memorização de frases consagradas ou da aceitação automática de conteúdos atribuídos a médiuns renomados. O combate efetivo às más inclinações e o consequente aprimoramento moral, objetivos do verdadeiro espírita, decorrem da precisa compreensão da realidade espiritual, o que é possível quando se adota a fé raciocinada proposta por Kardec. Essa fé não se sustenta em crenças passivas ou emocionais, mas em uma postura analítica, capaz de avaliar racionalmente as informações recebidas e de submetê-las ao crivo da lógica, da moral universal e da coerência com o conjunto do ensino dos Espíritos. Assim, incentivar o estudo aprofundado dos princípios doutrinário, o debate respeitoso com outras áreas do saber e, sobretudo, a adoção sistemática do critério da universalidade como método de validação de conteúdo, são práticas fundamentais para o desenvolvimento consciente e autêntico do movimento espírita. Dessa forma, o Espiritismo seguirá fortalecido em sua proposta original, marchando com solidez e discernimento no cumprimento de sua missão esclarecedora e moralizadora.

A crescente oferta de cursos e estudos sistemáticos das obras de Kardec tem favorecido uma compreensão mais crítica e robusta do Espiritismo, enquanto o estímulo ao diálogo com a ciência contribui para consolidar uma abordagem mais racional e menos fantasiosa. Paralelamente, pesquisas acadêmicas sobre temas como reencarnação, experiências de quase-morte e mediunidade, conduzidas por estudiosos não espíritas em diversos países, reforçam a legitimidade do estudo da realidade espiritual em bases empíricas e interdisciplinares.

Diante dos desafios e possibilidades do presente, os rumos do Espiritismo envolvem o resgate integral de sua proposta filosófico-científica: uma doutrina fundamentada na razão, no método e na moral, sem o devocionalismo que a obscurece. O caminho para que o movimento espírita brasileiro avance com firmeza e serenidade é pautado pelo conhecimento que liberta dos grilhões da ignorância mística e supersticiosa.



[1] HESS, David J. Spirits and Scientists: Ideology, Spiritism, and Brazilian Culture. University Park, PA: Penn State University Press, 1991

[2] STOLL, Sandra J. Entre dois mundos: o Espiritismo da França e no Brasil. Tese de Doutorado, São Paulo, USP, 1999.

[3] LEWGOY, Bernardo. O grande mediador: Chico Xavier e a cultura brasileira. Bauru: Edusc, 2004.

[4] ARRIBAS, Célia G. O crescimento do aspecto religioso do Espiritismo no Brasil no século XX e XXI: um estudo das representações sociais da doutrina espírita na contemporaneidade. Dissertação de Mestrado, São Paulo, PUC, 2008.

[5] QUINTELLA, Mauro. História do espiritismo no Brasil: origens, consolidação e desenvolvimento. AJEE, 2010.

[6] GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978


terça-feira, 2 de setembro de 2025

Sêneca e o Espiritismo

 Sêneca e o Espiritismo


 Marco Milani

 

Texto publicado na revista Candeia Espírita, nº 48, set/2025, p. 8-9


O diálogo entre a filosofia grega e o pensamento espírita revela interessantes afinidades e, ao mesmo tempo, diferenças. Enfatizando as semelhanças, Allan Kardec apontou treze preceitos propostos por Sócrates e Platão como ideias precursoras da doutrina espírita[1].

 Outro relevante filósofo da antiguidade que se destacou pela clareza de seus ensinamentos ético-morais e pelo estilo exortativo foi Sêneca (4 a.C. a 65 d.C.), expoente do estoicismo romano. Certamente, nem todos os seus ensinamentos se harmonizam com a visão espírita, mas muitos deles evidenciam a pertinência dessa interlocução filosófica

Sêneca concebia a vida humana como um percurso breve, em que o tempo deveria ser usado de modo sábio e consciente. Em seu tratado Da brevidade da vida, afirma que “não é que tenhamos pouco tempo, mas que desperdiçamos muito”[2], destacando que a verdadeira riqueza não está na posse de bens, mas no bom uso da existência em busca da sabedoria. Para ele, o bem supremo é a virtude, alcançada pelo domínio de si e pela conformidade com a razão universal, entendida como expressão da ordem cósmica.

Sêneca também defendia a fraternidade humana. Em Cartas a Lucílio, afirma que “o homem é coisa sagrada para o homem”[3], colocando a solidariedade como princípio de vida. Além disso, via a morte não como mal, mas como parte da ordem natural, que deveria ser aceita sem temor. A felicidade, nesse quadro, não se encontrava no poder ou na riqueza, mas na serenidade interior do sábio que vive conforme a natureza e aceita o destino.

Muitos desses pontos encontram paralelo na doutrina espírita. O Espiritismo ensina que a verdadeira vida é a espiritual, e que a encarnação é uma etapa educativa destinada ao progresso moral e intelectual. Da mesma forma que Sêneca valorizava o uso consciente do tempo, o Espiritismo convida a aproveitar a existência para o desenvolvimento das virtudes, lembrando que cada ato tem consequências ao indivíduo.

A crítica de Sêneca à busca desenfreada de riquezas e prazeres apresenta afinidades com os princípios espíritas. Conforme o ensino dos Espíritos[4], afirma-se que o apego aos bens materiais é um dos grandes entraves à elevação moral, e que a verdadeira liberdade consiste em não ser escravo das paixões. Ainda em Cartas a Lucílio, a máxima “não é pobre quem tem pouco, mas quem deseja muito” encontra eco na advertência espírita contra a cobiça e o egoísmo.

Um importante ponto de aproximação é a fraternidade universal. De acordo com a orientação moral de Sêneca, o homem deveria tratar o próximo com respeito e assumir a fraternidade como caminho de libertação interior.

Dentre os eventuais limites, a concepção inflexível do destino em Sêneca contrasta com a noção de autonomia relativa às escolhas individuais defendida pela doutrina espírita. Para o estoico, a vida está submetida à ordem cósmica imutável e a sabedoria consiste em aceitá-la com serenidade. O Espiritismo, embora adote a existência de leis divinas imutáveis, não abraça o determinismo, mas introduz a noção de livre-arbítrio. Assim, enquanto Sêneca enfatiza a resignação ao destino, o Espiritismo equilibra resignação e responsabilidade ativa.

Outra fronteira está na abordagem da morte. Para Sêneca, ela é dissolução natural e libertação da alma racional, mas não chega a desenvolver uma proposta estruturada da vida futura. O Espiritismo, por sua vez, apresenta detalhadamente a sobrevivência do Espírito, sua imortalidade e o progresso contínuo através das reencarnações. Se em Sêneca a morte é aceitação filosófica, no Espiritismo é passagem consciente para a continuidade do Espírito objetivando a sua realização na perfeição de que é suscetível.

Também há distinções no fundamento teológico. Sêneca fala em deuses e em razão universal, mas sua filosofia possui caráter imanentista, entendendo o divino como presente e ativo na ordem cósmica. O Espiritismo, por sua vez, aproxima-se do deísmo providencialista[5]. Essa diferença de horizonte metafísico coloca em contraste a ética estoica e a moral espírita, explicitamente ligada a Deus.

Embora tenha vivido na época do cristianismo nascente, Sêneca não faz qualquer referência aos seus princípios, mantendo sua filosofia dentro dos marcos do estoicismo romano. Já no Espiritismo, Jesus como modelo e guia da humanidade, é a maior referência moral.

Claramente há um terreno comum entre Sêneca e o Espiritismo na valorização da virtude, do desapego, da fraternidade e da serenidade diante da vida e da morte. Ambos se dirigem ao homem comum com um discurso prático, preocupado com o aprimoramento moral sem especulações abstratas. O Espiritismo vai além ao oferecer uma explicação mais ampla sobre a imortalidade, a reencarnação, o livre-arbítrio e a pedagogia divina.

Pode-se, assim, considerar Sêneca perante a revelação espírita como um precursor ético, cuja filosofia disciplina o homem para promover a fraternidade em sua essência, mesmo que limitada ao horizonte estoico da razão e do destino.

Sêneca ensina a viver com dignidade no tempo presente, enquanto o Espiritismo amplia esse horizonte ao ensinar a viver com dignidade no presente à luz da imortalidade do Espírito.

 



[1] Ver O evangelho segundo o espiritismo, Introdução, item IV.

[2] SÊNECA, L. A. Da brevidade da vida. São Paulo: Cia das Letras, 2014.

[3] Idem. Cartas a Lucílio. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.

[4] Ver as questões 922 a 943 em O livro dos Espíritos e o capítulo XVI de o evangelho segundo o espiritismo.

Encontro anual de pesquisadores espíritas

 

Encontro anual de pesquisadores espíritas

A. J. Orlando

Texto publicado na revista Candeia Espírita, nº 48, set/2025, p. 25

Nos dias 30 e 31/08/25, o Centro Espírita Allan Kardec, em Campinas, recebeu pesquisadores espíritas de todo o Brasil, para o 20o Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo. Na oportunidade foram apresentados cinco trabalhos, submetidos à análise de pares, para o evento anual que teve como tema central Justiça divina segundo o espiritismo, em comemoração aos 160 anos da primeira edição da quarta obra fundamental de Allan Kardec, O céu e o inferno.

Além do apoio do centro campineiro, o evento sempre conta também com as participações da USE-SP União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo e do CCDPE-ECM Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo Eduardo Carvalho Monteiro.

LIHPE

A Liga de Pesquisadores do Espiritismo (LIHPE) é uma comunidade virtual que reúne pesquisadores, sejam espíritas ou não, sejam acadêmicos ou não, que se interessam em pesquisar o espiritismo ou o Movimento Espírita. Seu objetivo é a ajuda mútua para o desenvolvimento das pesquisas, oferecendo aos integrantes, uma gama de informações, através da troca de informações entre os integrantes. Atende, dentro do possível, solicitações de pesquisadores que não fazem parte do grupo.

A sigla LIHPE

Fundada sob a denominação de Liga dos Historiadores e Pesquisadores do Espiritismo, com o tempo reduziu-se o seu nome para somente Liga de Pesquisadores do Espiritismo. Apenas por tradição, manteve-se o “H” na sigla, a qual vem sendo usada normalmente.

Registros históricos

A data simbólica da criação da LIHPE é 17 de março de 2002, por iniciativa de Eduardo Carvalho Monteiro, o qual reuniu um grupo de confrades para criar uma rede que congregasse historiadores e pesquisadores em 14 estados brasileiros e membros na Áustria, Suécia, Inglaterra, Estados Unidos e Portugal.

Espiritismo e ciência

Conforme afirmou Allan Kardec, “O espiritismo e a ciência se completam reciprocamente; a ciência, sem o espiritismo, se acha na impossibilidade de explicar certos fenômenos só pelas leis da matéria; ao espiritismo, sem a ciência, faltariam apoio e comprovação”. (A gênese, Cap. 1, i. 16).



quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Espiritismo, Juventude e Educação


Espiritismo, Juventude e Educação

 

Marco Milani

 

O movimento espírita brasileiro enfrenta um desafio que merece reflexão aprofundada: enquanto proclama a universalidade de seus princípios e a importância da educação moral para todas as idades, observa-se, na prática, um predomínio da população adulta, especialmente adultos maduros e idosos, nas atividades doutrinárias e estudos sistematizados. A presença infantojuvenil tem sido numericamente inferior e, em muitos casos, periférica às dinâmicas dos centros espíritas. Tal realidade se entrelaça com aspectos socioculturais e educacionais que afetam diretamente a capacidade de compreensão e interesse dos jovens pela Doutrina Espírita.

Parte desse cenário pode ser compreendida à luz da formação educacional heterogênea no Brasil, especialmente no que se refere à alfabetização e ao desenvolvimento das habilidades de leitura, escrita e pensamento abstrato.

O país tem adotado, nas últimas décadas, métodos pedagógicos fortemente influenciados por correntes construtivistas e socioconstrutivistas. Tais abordagens, inspiradas em autores como Jean Piaget (1990), Lev Vygotsky (2007), Jerome Bruner (2001) e Paulo Freire (2004), supõem valorizar a autonomia do aluno, a aprendizagem pela experiência e o papel da interação social na construção do conhecimento. Embora esses aportes tenham contribuído ao debate educacional, estudos empíricos apontam falhas graves na aplicação dessas metodologias, sobretudo quando adotadas de forma exclusiva ou desprovida de apoio estrutural. Kirschner, Sweller e Clark (2006) demonstraram que métodos com baixa orientação, como a aprendizagem por descoberta, tendem a ser ineficazes para alunos com pouca bagagem cognitiva, sobrecarregando sua memória de trabalho. Mayer (2004) reforça que a aprendizagem significativa depende, em grande parte, de instrução clara e sistemática, especialmente na alfabetização. No Brasil, a obra de Benedetti (2019) explicita como a adesão acrítica ao socioconstrutivismo contribuiu para um quadro de fracasso na alfabetização e no domínio da linguagem escrita, o que gera consequências nos ciclos posteriores.

Segundo os dados do Instituto Paulo Montenegro (IPM, 2018), cerca de 38% dos alunos de cursos superiores não conseguem interpretar adequadamente textos mais complexas que exigem abstração e domínio pleno de leitura e escrita. A população em faixas educacionais menores apresenta mais dificuldade.

Não por acaso, o país figura entre aqueles com piores desempenhos em testes educacionais internacionais, como o PISA (Programme for International Student Assessment), TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study) e PIRLS (Progress in International Reading Literacy Study). Mesmo em testes nacionais, como o SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), aponta-se níveis alarmantes de analfabetismo funcional em todas as etapas escolares, principalmente no ensino médio.

Esse contexto gravíssimo limita não apenas o acesso ao conhecimento educacional, mas também a capacidade de compreender adequadamente conteúdos mais filosóficos, como os presentes nas obras de Allan Kardec, cuja estrutura é logicamente encadeada e exige maturidade para assimilar conceitos como perispírito, justiça divina, reencarnação, livre-arbítrio, expiação e pluralidade dos mundos habitados.

Nesse contexto, o desafio dos centros espíritas é duplo: de um lado, manter a coerência doutrinária, que exige estudo, raciocínio e reflexão; de outro, acolher a juventude com suas limitações educacionais, oferecendo meios acessíveis de aproximação com os princípios espíritas.

As casas espíritas precisam, com urgência, adequar suas práticas à complexa realidade educacional brasileira. Ignorar esses limites, mantendo uma abordagem expositiva e textual rígida, pode afastar justamente os que mais precisam do acolhimento, conforto e compreensão da própria realidade espiritual (MILANI, 2023, p. 4).

Um dos equívocos mais recorrentes nesse cenário é a ideia ilusória de que basta apresentar os jovens aos preceitos cristãos, como a caridade, o perdão, a humildade, sem oferecer-lhes a fundamentação doutrinária espírita que os sustenta e racionaliza. Ainda que esses princípios morais sejam essenciais e estejam presentes em várias tradições religiosas, o Espiritismo lhes confere profundidade e coerência, ao explicá-los à luz da justiça divina, da reencarnação, das leis morais e da imortalidade da alma. Quando se suprime essa fundamentação, corre-se o risco de apresentar apenas uma moral genérica, emocional e desarticulada do pensamento espírita, o que dificulta tanto o entendimento da justiça divina e a necessidade do esforço individual frente às adversidades quanto a aplicação consciente desses valores na vida prática.

É importante reconhecer que a capacidade e compreensão desejada nem sempre é alcançada de forma espontânea por todos os jovens, sobretudo por aqueles vindos de contextos educacionais fragilizados. Por isso, a simples exposição da doutrina, em moldes tradicionais de estudo, pode não ser suficiente para despertar o interesse nem garantir a reflexão necessária.

Diante disso, torna-se imprescindível que os centros espíritas adotem estratégias didáticas e comunicacionais que respeitem a diversidade cognitiva da população infantojuvenil. Isso envolve, por exemplo, o uso de recursos visuais, rodas de conversa mediadas, projetos com linguagem acessível, experiências práticas baseadas na vivência ética e afetuosa, atividades interativas e leitura compartilhada. Ao mesmo tempo, é fundamental manter a estrutura lógica, motivando os jovens, progressivamente, ao domínio doutrinário.

Há, felizmente, valorosas iniciativas já em curso nesse sentido. Entidades federativas como a União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE-SP) promovem constantes encontros, fóruns e seminários voltados à reflexão sobre o acolhimento e educação dos jovens nos centros espíritas. Essas ações revelam esforço institucional legítimo e comprometido com a formação das novas gerações. No entanto, o tema exige maior envolvimento de todos, dirigentes, educadores, famílias e frequentadores, para que as boas práticas se ampliem, sejam compartilhadas e se convertam em transformação efetiva das realidades locais.

Essa postura exige sensibilidade dos dirigentes espíritas, além de investimento na formação pedagógica das equipes de educação infantojuvenil. A simples replicação de modelos expositivos usados com adultos não atende às necessidades de um público jovem, muitas vezes emocionalmente vulnerável e cognitivamente desigual. A proposta não é diluir o Espiritismo, mas mediá-lo com inteligência, generosidade e criatividade, tornando-o acessível sem comprometer sua profundidade.

Para que o Espiritismo cumpra sua missão de regeneração da humanidade, é preciso olhar com atenção para a juventude, não como “futuro do movimento”, mas como integrante do presente que demanda respostas às suas inquietações. A compreensão doutrinária passa por um esforço constante de traduzir seus princípios para diferentes aptidões intelectuais, em todos os tempos e realidades.

 

Referências

BENEDETTI, Kátia S. A falácia socioconstrutivista: por que os alunos brasileiros deixaram de aprender a ler e escrever. Itatiba: Kírion, 2019.

BRUNER, Jerome. A cultura da educação. Porto Alegre: Artmed, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

INSTITUTO PAULO MONTENEGRO (IPM). Ação Educativa - Indicador de Analfabetismo Funcional - INAF 2018. São Paulo: Instituto Paulo Montenegro, 2018.

KIRSCHNER, Paul A.; SWELLER, John; CLARK, Richard E. Why minimal guidance during instruction does not work: An analysis of the failure of constructivist, discovery, problem-based, experiential, and inquiry-based teaching. Educational Psychologist, v. 41, n. 2, p. 75–86, 2006.

MAYER, Richard E. Should There Be a Three-Strikes Rule Against Pure Discovery Learning? American Psychologist, v. 59, n. 1, p. 14–19, 2004.

MILANI, Marco. Analfabetismo doutrinário. Correio News, 4 maio 2020. Disponível em: https://correio.news/especial/analfabetismo-doutrinario. Acesso em: 19 jul. 2025.

PIAGET, Jean. A epistemologia genética. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Indignação seletiva: o viés político-ideológico de grupos pseudoespíritas

Indignação seletiva: o viés político-ideológico de grupos pseudoespíritas

 

Marco Milani

 

Nos últimos anos, tornou-se cada vez mais comum observar manifestações de determinados grupos que se intitulam espíritas, mas que, na prática, desviam-se dos fundamentos originais do Espiritismo. Entre os diversos sinais dessa distorção, um dos mais evidentes é a adoção de posicionamentos políticos e ideológicos enviesados, muitas vezes sob o disfarce de uma pretensa busca pela paz, pela justiça social ou pelos direitos humanos. Um exemplo notório dessa postura é a recente publicação de manifestos por parte desses grupos em apoio à Palestina, com duras críticas ao Estado de Israel, ignorando, deliberadamente, o contexto mais amplo dos conflitos armados que assolam o planeta.

Esses manifestos, travestidos de clamor humanitário, denunciam com veemência os ataques de Israel e proclamam solidariedade ao povo palestino, evocando princípios de compaixão e fraternidade que, em tese, estariam alinhados com o ideal espírita. No entanto, o que se revela por trás dessa retórica é uma clara indignação seletiva, movida não por princípios universais, mas por afinidades político-ideológicas marcadamente alinhadas à esquerda identitária e à retórica anticapitalista e contrária aos valores de liberdade que vem permeando parte da militância pseudoespírita.

Essa seletividade se escancara quando se observa o silêncio absoluto desses mesmos grupos diante de outros conflitos ainda mais sangrentos e prolongados. A guerra entre Rússia e Ucrânia, por exemplo, já ultrapassou centenas de milhares de mortos e milhões de deslocados, com ataques sistemáticos à infraestrutura civil ucraniana, crimes de guerra documentados e uma ameaça constante à estabilidade europeia. No entanto, pouco ou nada se ouviu dos manifestantes “pela paz” quando a invasão russa foi deflagrada em 2022 ou mesmo quando seus efeitos devastadores se intensificaram nos anos seguintes.

Mais ainda, o planeta contabiliza atualmente mais de trinta conflitos armados ativos, em países como Etiópia, Sudão, Mianmar, Iêmen, Congo e Síria, muitos deles com níveis de violência extrema, limpeza étnica, perseguição religiosa e colapsos humanitários. São milhões de mortos, feridos e refugiados ignorados por esses mesmos que, seletivamente, voltam seus olhos apenas para causas que se ajustam à sua narrativa ideológica, especialmente quando envolvem a crítica ao Ocidente, a Israel, ou a valores considerados "imperialistas". O sofrimento humano parece só comover quando encaixa-se em determinado contexto político, o que revela não compaixão genuína, mas instrumentalização da dor alheia.

Do ponto de vista espírita, essa postura é duplamente condenável. Primeiro, porque contraria a ética da imparcialidade, do amor ao próximo sem distinções e da fraternidade universal defendida por Kardec. Reconhece-se o verdadeiro espírita pelo entendimento e prática dos princípios doutrinários, objetivando a própria transformação moral com esforços domar as suas más inclinações. Entre essas inclinações, encontra-se o sectarismo ideológico, que embaça a razão, incita o julgamento parcial e mina a serenidade do discernimento.

Segundo, porque ao se envolverem com bandeiras político-partidárias, esses grupos comprometem a neutralidade doutrinária que Kardec tanto prezava. O Espiritismo não é um instrumento de militância, mas um sistema filosófico, científico e moral que busca a elevação do ser humano acima das paixões políticas, e não sua sujeição a elas. Misturar Espiritismo com ideologias políticas, sejam elas de direita ou de esquerda, é trair sua essência, seu método e sua finalidade.

A indignação seletiva não é apenas um erro ético e filosófico: é um sintoma de uma grave enfermidade moral que mancha o movimento espírita. Ao optar pela militância política, esses grupos propõem que o sectarismo se sobreponha à razão e à universalidade dos princípios espíritas, buscando converter o Espiritismo em palanque ideológico.

A paz não se constrói com partidarismos, nem a justiça floresce sob o manto da hipocrisia seletiva. Que cada sofrimento humano nos comova igualmente, que cada vítima de guerra seja por nós acolhida em prece e solidariedade, independentemente da geopolítica que a cercou. Só assim estaremos sendo coerentes ao Espiritismo de Kardec: racional, livre, universalista e essencialmente cristão.

 

 

sexta-feira, 1 de agosto de 2025

Cuidados cognitivos na divulgação espírita

Cuidados cognitivos na divulgação espírita

 

Marco Milani

 

Texto publicado na revista Candeia Espírita, nº 47, ago/2025, p. 9-10

 

A compreensão dos princípios espíritas está intimamente ligada ao nível de amadurecimento intelectual e moral de cada Espírito encarnado. O educador Allan Kardec já apontava que o ensino espírita deveria ser adaptado à capacidade de assimilação dos ouvintes, sem jamais vulgarizar ou trair os fundamentos da Doutrina[1]. Desse modo, a divulgação precisa verificar as diferenças de funcionamento cognitivo-neurológico, sem reduzir o conteúdo à simplificação grosseira, mas traduzindo-o de forma acessível, progressiva e fraterna.

No caso de crianças, por exemplo, a linguagem simbólica, os relatos morais e os exemplos práticos devem ser priorizados, tendo em vista sua fase de pensamento concreto. A assimilação dos princípios como reencarnação, justiça divina e lei de progresso deve ocorrer por meio de narrativas significativas, como pela contação de histórias com dramatização simples, reforçando o aprendizado com um estímulo lúdico.

Já com jovens, é necessário introduzir o raciocínio crítico e os dilemas morais, mostrando como os princípios espíritas dialogam com a vida cotidiana, os valores contemporâneos e os conflitos existenciais próprios da adolescência e juventude. Oficinas e debates temáticos favorecem essa proposta.

Com os adultos, a tarefa é mais desafiadora e diversificada, pois há aqueles com formação limitada ou distorcida, e outros já preparados para estudos mais aprofundados. Torna-se essencial, portanto, empregar metodologias dialógicas que considerem os referenciais prévios, incentivem o questionamento e promovam a autonomia de pensamento e comportamento confiante e corajoso, típico da fé racional inabalável[2]. A formação de grupos de estudo segmentados por nível de familiaridade com os princípios espíritas, conduzidos por facilitadores com sólidos conceitos doutrinários que incentivem a reflexão racional apresentando as fontes e referências utilizadas nas obras de Allan Kardec direciona para a construção consciente do conhecimento espírita.

Importa reconhecer, também, que os desafios educacionais persistentes no Brasil contribuem para uma heterogeneidade significativa no público que frequenta as instituições espíritas. Desigualdades no acesso à escolarização, dificuldades de leitura e escrita, déficit na formação científica e filosófica e lacunas no estímulo ao pensamento crítico refletem-se diretamente na forma como os conteúdos doutrinários são recebidos e compreendidos. Dessa maneira, centros espíritas convivem simultaneamente com frequentadores altamente escolarizados e outros com trajetória educacional fragilizada, exigindo dos dirigentes e colaboradores um olhar atento às múltiplas formas de aprender e processar ideias, sem elitismo, mas também sem empobrecimento da mensagem. Tal realidade reforça a necessidade de abordagens graduais, acessíveis e respeitosas, capazes de acolher diferentes capacidades de assimilação e realidades socioeconômicas sem comprometer a integridade doutrinária.

Adicionalmente, a cultura local e as experiências pessoais influenciam decisivamente na recepção da mensagem. Por isso, a divulgação doutrinária deve evitar modelos rígidos e engessados, acolhendo as dúvidas e promovendo a empatia e a escuta ativa. O expositor, o educador infantojuvenil ou o trabalhador espírita de forma geral deve evitar tanto a tecnocracia discursiva com a repetição estéril de fórmulas ou dogmas, quanto o sincretismo eclético que dissolve a identidade doutrinária. A solução está em seguir o método progressivo e lógico de Kardec: partir do conhecido para o desconhecido, do simples para o complexo, do sensível para o abstrato.

É necessário compreender que o Espiritismo não se impõe, mas se propõe. Portanto, o êxito na divulgação doutrinária não reside em convencer a todos, mas em semear com clareza, firmeza lógica e atitude amorosa, compreendendo o momento de cada Espírito. Assim, divulgar a Doutrina Espírita de forma eficaz exige alinhar coerência doutrinária, sensibilidade pedagógica e atenção à pluralidade de perfis intelectuais e sociais dos interlocutores.

Diante desses cuidados, cabe aos dirigentes, expositores e educadores espíritas ponderarem sobre suas práticas e renovarem, sempre que necessário, as estratégias de ensino e divulgação doutrinária utilizados em suas instituições. É preciso perguntar, com sinceridade e lucidez: estamos realmente favorecendo a interiorização dos valores e a vivência do Espiritismo segundo as características de nossos públicos, ou apenas reproduzindo modelos automáticos que desconsideram os processos cognitivos e culturais dos nossos interlocutores?

Compatível com a proposta kardequiana de fé raciocinada, a divulgação espírita deve unir clareza doutrinária e discernimento formativo, promovendo não apenas o entendimento conceitual, mas também o engajamento ético e a responsabilidade do ser perante o próprio desenvolvimento moral.



[1] Ver O livro dos médiuns, 1ª parte, Capítulo 3 – O método.

[2] Ver O evangelho segundo o espiritismo, Capítulo 19, item 7.