Velha tática dos
adversários do Espiritismo
Marco Milani
(Texto publicado na revista Dirigente Espírita, ed. 193,
jan/fev 2023, p. 11-12)
Em junho de 1865,
Allan Kardec publicou na Revista Espírita o importante artigo “Nova tática dos
adversários do Espiritismo”, no qual destacava o incômodo gerado por essa
filosofia nascente que rompia com as carcomidas tradições religiosas firmadas
sobre a fé cega e, principalmente, desmascarava o ilusório e alienante
materialismo, declarando-o como o seu maior antagonista.
Ao rapidamente disseminar
suas ideias e angariar adeptos e simpatizantes em dezenas de países e em todas
as camadas sociais, o Espiritismo enfrentou a forte resistência ególatra daqueles
que viram suas convicções mais profundas sobre a realidade serem questionadas ou
refutadas.
Na ocasião, Kardec
alertou que os adversários tentavam comprometer, ridicularizar e desacreditar a
doutrina, semeando de forma sub-reptícia a divisão e lançando fachos de
discórdia para fomentar a perturbação entre os adeptos e orientou:
É, pois, um dever de
todos os espíritas sinceros e devotados repudiar e desautorizar abertamente, em
seu nome, os abusos de todo gênero que pudessem comprometê-la, a fim de não
lhes assumir a responsabilidade; pactuar com os abusos seria tornar-se cúmplice
e fornecer armas aos nossos adversários.[1]
Além de propostas
sincréticas que tentavam misturar crendices e ideias místicas no ensino dos
Espíritos, outras questões poderiam servir de munição aos detratores. Uma delas
era a tentativa de impor uma roupagem partidária à doutrina espírita, como se o
Espiritismo pudesse ser reduzido a um apêndice de ideologias políticas ou
regimes em voga.
Na Revista Espírita
de fevereiro de 1863 são relatados diversos ataques proferidos por sacerdotes
católicos durante seus sermões, acusando o Espiritismo de pregar a desunião da
família, o adultério, o aborto e o comunismo. Sobre esses fatos, Kardec comenta
a insensatez desses detratores de imputarem à doutrina espírita o que ela,
justamente, prega o oposto.[2]
Kardec afirmou que
bastava o estudo sério do Espiritismo para refutar tais acusações e ainda
destacou: “Quem poderá crer que pregamos o comunismo depois das instruções dadas
a respeito no discurso publicado in extenso no relatório de nossa viagem
em 1862?”[3]
Na referida viagem,
Kardec dirigiu-se aos operários lioneses citando uma esclarecedora e objetiva
mensagem mediúnica de Erasto sobre o engodo materialista expresso em propostas
utópicas e totalitárias.
Acabo de pronunciar a
palavra igualitária. Julgo útil nela deter-me um pouco, porque não vimos
pregar, em vosso meio, utopias impraticáveis, pois, ao contrário, repelimos
energicamente tudo quanto pareça ligar-se às prescrições de um comunismo
antissocial. Antes de tudo, somos essencialmente propagandistas da liberdade
individual, indispensável ao desenvolvimento dos encarnados. Consequentemente,
somos inimigos declarados de tudo quanto se aproxime dessas legislações
conventuais, que aniquilam brutalmente os indivíduos. Embora me dirija a um
auditório em parte composto de artífices e proletários, sei que suas
consciências, esclarecidas pelas radiações da verdade espírita, já repeliram
todo contato com as teorias antissociais dadas com apoio da palavra igualdade.[4]
Em oposição ao que
alguns poderiam supor, por má-fé ou ignorância, Kardec nunca isentou-se de
enfatizar a participação ativa do espírita nos rumos da sociedade, contribuindo
para a melhoria das relações humanas, mas nunca prescreveu cartilhas partidárias
ou ideológicas para o exercício espontâneo da solidariedade e fraternidade. O alerta
sobre as ideologias totalitárias serviu de orientação sobre os direitos e as
escolhas individuais, valorizando o livre-arbítrio e a liberdade de consciência.
Nas reuniões
regulares da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas sentavam-se, lado a
lado, monarquistas, liberais e socialistas e o que os unia era o mesmo ideal
espírita. As discordâncias e discussões apaixonadas sobre os modelos para se dirigir
e melhorar a sociedade não eram pautas a serem debatidas por seus simpatizantes
diante do ideal maior da união fraterna entre todos, indistintamente. Sobre
essa questão, Kardec assim se posiciona:
Devo ainda
assinalar-vos outra tática dos nossos adversários, a de procurar comprometer os
espíritas, induzindo-os a se afastarem do verdadeiro objetivo da doutrina, que
é o da moral, para abordarem questões que não são de sua alçada e que, a justo
título, poderiam despertar suscetibilidades e desconfianças. Não vos deixeis
cair nessa armadilha; afastai cuidadosamente de vossas reuniões tudo quanto se
refere à política e a questões irritantes; a tal respeito, as discussões apenas
suscitarão embaraços, enquanto ninguém terá nada a objetar à moral, quanto esta
for boa.[5]
Quase 160 anos
depois, a tática dos adversários do Espiritismo envelheceu, mas não se alterou.
Adaptando-se ao progresso tecnológico, os detratores continuam a tentar
desacreditar a doutrina e fomentar cizânia entre os espíritas.
A disseminação de
práticas sincréticas, informações supersticiosas e místicas, além do
recrudescimento de infiltrações de caráter político-ideológico são recorrentes
e exigem dos adeptos conscientes a aplicação da fé raciocinada para separar o
joio do trigo e repudiar abertamente essas deturpações que não possuem nada de
novo em sua essência.
Fonte: https://usesp.org.br/wp-content/uploads/2023/01/DE193.pdf
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