Reclamações e vitimismo
Marco Milani
Reclamar é uma atitude humana. Alguns
reclamam mais, outros menos. Alguns com razão aos olhos do próximo, outros com
razão somente aos próprios olhos.
Ao nos manifestarmos sobre o que acreditamos
ser necessário e correto, exercemos o livre-arbítrio e buscamos o aprimoramento
de determinado contexto, entretanto, nem sempre o que reivindicamos guarda relação
com a justiça e a verdade. Em nosso acanhado nível evolutivo, não é raro observarmos
o orgulho e o egoísmo motivarem essas manifestações.
Uma forma orgulhosa e imatura de
posicionamento é culpar terceiros pela situação em que o reclamante se encontra.
Os outros seriam os responsáveis diretos pelas infelicidades e desconfortos
percebidos. Se não fossem aquelas pessoas, tudo seria diferente...
O centro espírita não está imune desses comportamentos,
pois não é o rótulo que determina o comportamento dos frequentadores. Podemos encontrar
queixosos recorrentes que alegam ser vítimas de dirigentes por não terem suas
ideias e propostas revolucionárias acatadas na casa espírita. Algumas queixas
podem ser justas e outras não.
Muitos reclamantes se consideram perseguidos
e pobres vítimas das circunstâncias por não terem todos os seus desejos satisfeitos.
Alguns potencializam suas queixas nas redes
sociais, tentando cooptar simpatizantes em causa própria. Acusam dirigentes de
entidades espíritas de impedirem o desenvolvimento do espiritismo no Brasil e
no mundo por não lhes oferecer a tribuna para se apresentarem ou por não
obterem espaços privilegiados em eventos para venderem os seus livros.
Mas críticas a dirigentes existem desde os
primórdios do espiritismo, pois o próprio Kardec foi chamado de centralizador e
acusado por adeptos místicos de impedir que “novos ensinamentos”, obtidos sem
qualquer critério metodológico sério, fossem inseridos no corpo doutrinário. Um
desses queixosos foi o advogado Jean-Baptiste Roustaing, que afirmava ter
recebido “novas revelações”, mas como essas se mostravam bem distante do bom
senso e da coerência doutrinária, foram justificadamente rejeitadas por Kardec.
Nos dias de hoje, basta um clique para se
fazer circular eletronicamente textos construídos com as mais variadas
intenções e é cômodo para alguns simplesmente se afirmarem vítimas injustiçadas
de malvados dirigentes de centros espíritas que tolhem suas maravilhosas
iniciativas. Servindo-se do discurso acusatório atual, Roustaing chamaria
Kardec de conservador, retrógrado, reacionário e outros adjetivos da moda.
Certamente, todos erram e podem melhorar,
portanto o diálogo respeitoso e racional sempre será o melhor caminho para os
esclarecimentos necessários às partes envolvidas em divergências de ideias. As
conquistas morais, entretanto, não são obtidas por reclamações ou vitimismo,
mas por trabalho e mérito.
* Texto publicado no
jornal Correio Fraterno, edição 477, set/out 2017.
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