Candidato espírita ou
espírita candidato?
Marco Milani*
Texto publicado no boletim Dirigente Espírita, jul/ago 2018, nº 166, p. 11
Em ano eleitoral é comum encontrarmos aqueles
que supõem que o rótulo religioso ateste a integridade e a competência do
candidato.
O movimento espírita não está livre desse
discurso. É possível ouvir, vez ou outra, alguém dizendo que “espírita vota em
espírita”. Será mesmo que esse é o critério adequado para identificarmos um
“bom” candidato?
Quais seriam as razões para acreditar, por
exemplo, que um valoroso colaborador de um centro espírita seria um ótimo
vereador ou deputado?
Ao afirmar que conhece a seriedade do colega e,
por isso, gostaria de vê-lo nas lides políticas, esse eleitor demonstra ter
adotado o critério da proximidade e relação simpática com o candidato. Adicionalmente,
poder-se-ia cogitar que, sendo espírita, esse candidato defenderia os princípios
e valores doutrinários em sua função pública, assim como protegeria as
instituições espíritas, os seus interesses e suas atividades. São argumentos
compreensíveis, mas superficiais.
Sob a perspectiva daqueles que compartilham a
mesma crença, naturalmente existe uma identificação com a postura moral, mas as
semelhanças podem parar por aí se as propostas econômicas, políticas e sociais
que o candidato abraçar forem diferentes daquelas que o eleitor acredita serem
as mais adequadas.
Por exemplo, um candidato que se afirme
espírita e que esteja filiado a um partido que possua uma agenda programática favorável
ao aumento do déficit fiscal para financiar medidas populistas e que gerarão
sérios danos à economia com reflexos diretos no aumento da inflação e
pauperização da população no longo prazo seria um bom candidato? Não parece ser.
O programa do partido político que o candidato
representa é muito importante e pode sinalizar muito mais sobre as propostas
que ele realmente defende do que, simplesmente, afirmar-se espírita. Ao
contrariar as diretrizes do partido, o filiado pode ser, inclusive, expulso.
No polarizado cenário político nacional, há
espiritas em todas as trincheiras ideológicas. Inexiste uma posição partidária
espírita e constitui-se uma agressão à liberdade individual a tentativa de se
buscar um pensamento hegemônico eleitoral. Fica claro, portanto, que não existe
um candidato que represente o espiritismo nem os seus adeptos de maneira
uniforme.
Alguns militantes políticos, infiltrados nas
fileiras espíritas, tentam impor convicções particulares pelo constrangimento.
Chegam ao cúmulo de publicarem nas redes sociais mensagens como: “espírita que
defende esse ou aquele candidato não é espírita”. Supõem-se senhores da razão,
desprezam a diversidade de opiniões e desrespeitam a liberdade de consciência.
Ainda, de maneira maniqueísta, rotulam o
espiritismo como se fosse de esquerda ou direita, socialista ou liberal, isso
ou aquilo. Pinçam trechos dos ensinamentos dos espíritos para os interpretarem por
conveniência, como se houvesse um direcionamento doutrinário explícito ou
implícito nesse sentido e os adeptos deveriam votar somente em candidatos que partilhassem
dessas mesmas visões.
O espiritismo não está preso na transitoriedade
dos problemas locais e sua proposta repousa no aperfeiçoamento moral e
intelectual do ser humano, sem receitas ou fórmulas programáticas sociais.
A deterioração da situação econômica vivenciada
no Brasil, fruto de políticas intervencionistas desastrosas com graves reflexos
sociais durante a última década não se resolve pelo rótulo religioso.
Não somente o espírita, mas qualquer um, na
condição de cidadão, tem a possibilidade de agir a favor da construção de uma
sociedade melhor e uma das maneiras de participar desse processo é portar-se,
condignamente e com competência, em todas as atividades que desempenhar, seja
na vida privada ou pública.
Há candidatos que se declaram
espíritas e atraem a simpatia de alguns adeptos, mas não existem candidatos
dos espíritas e, muito menos, deve existir uma variação do voto de cabresto no
movimento espírita.
Fonte: http://www.usesp.org.br/
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