Inteligência
artificial e referências espíritas
Marco
Milani
Texto publicado na Revista Candeia Espírita, nº 33, junho de 2024, p. 8-9
O uso massivo da inteligência artificial (IA) apresenta um enorme potencial
transformador nas atividades humanas, assim como proporciona desafios
significativos em diferentes aspectos éticos e práticos. Certamente, não se
trata de uma panaceia, capaz de resolver todos os problemas individuais e
coletivos, mas é muito mais que um simples avanço tecnológico.
O desenvolvimento da IA depende fortemente do conhecimento acumulado.
Os algoritmos são criados, treinados e refinados por cientistas e engenheiros
que utilizam princípios da matemática, estatística, neurociência e outras
disciplinas. Isso não significa, entretanto, que ela possua a capacidade de
raciocinar de forma profunda e abstrata, como os seres humanos fazem. A
capacidade de resolver problemas complexos que exigem pensamento criativo e
flexível ainda é um desafio para a IA.
Ao se explorar o conhecimento espírita com as atuais ferramentas de IA,
identifica-se uma valiosa contribuição para a análise dos objetos em pauta,
porém, também se evidenciam algumas fragilidades decorrentes da base de dados
que os algoritmos de IA se servem para a geração de respostas. Uma dessas
fragilidades advém da própria concepção do que seria uma informação
legitimamente considerada “espírita”.
Sob o aspecto doutrinário, a fonte fidedigna de informações é,
certamente, o conjunto das obras de Allan Kardec, com destaque para as chamadas
obras fundamentais que reúnem o ensino dos Espíritos que passou pelo critério
metodológico da universalidade. Todas as complexas relações inerentes aos
princípios e conceitos sistematizados e organizados por Allan Kardec, embora
com clareza e objetividade típicos de um exímio educador, exigem atenção e
maturidade cognitiva.
Algoritmos de IA que não diferenciarem a excelência metodológica do
ensino dos Espíritos validados pelo critério kardequiano da universalidade e
não as priorizarem hierarquicamente diante de outras fontes rotuladas como
“espíritas”, poderão cometer graves erros doutrinários e distorcerem as
informações geradas.
Se as respostas geradas pela IA como representativas do conhecimento
espírita contiverem informações contraditórias aos princípios e conceitos
doutrinários apresentados por Kardec, então induzir-se-á ao erro de se aceitar
algo não-espírita como espírita. O usuário da informação falsa que confiar
imprudentemente nesse algoritmo de IA desenvolverá e disseminará um
conhecimento pseudoespírita.
Não basta ser classificada como uma fonte mediúnica para as informações
ali obtidas serem tomadas como integrantes do conhecimento espírita, pois para
isso deveriam ter sido validadas metodologicamente e não aceitas como verdades
apenas confiando-se em falaciosos argumentos de autoridade.
Textos romanceados, ficcionais e opinativos, os quais abundam o mercado
editorial voltado ao público espiritualista, ainda que possam tratar de
edificantes valores morais e tentem ilustrar as relações entre os mundos físico
e invisível, costumeiramente carregam generosas inserções lúdicas e
fantasiosas. Tais fontes não deveriam, portanto, ser tomadas pelos algoritmos
de IA como referências do mesmo nível de validade do conteúdo apresentado por
Allan Kardec.
Assim, as ferramentas de IA são muito bem-vindas e poderão contribuir
em muito para as reflexões e construções de argumentos espíritas, tomando-se o
cuidado de identificar conceitualmente o que são, de fato, informações
espíritas e não-espíritas sob parâmetros doutrinários.
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