quarta-feira, 6 de abril de 2022

Há uma revelação luisina? por Irmão Saulo (Herculano Pires)


Há uma revelação luisina?

 

Irmão Saulo (Herculano Pires)

 

(Texto extraído do livro Herculano Pires, o apóstolo de Kardec, Capítulo 19 – Minhas lutas doutrinárias)

 

Começaremos transcrevendo uma crônica sua assinada com o pseudônimo “Irmão Saulo” intitulada “Há uma revelação luisina?”, a qual refuta um artigo de Salvador Gentile (diretor de “Anuário Espírita”, editado em Araras, Estado de São Paulo), a propósito da obra Nosso Lar, psicografada por Chico Xavier. A crônica de Herculano Pires estampada no “Diário de São Paulo” reveste-se de importância porque ao surgirem as primeiras obras do Espírito André Luiz alguns líderes, demonstrando imaturidade doutrinária, proclamaram nas tribunas e pelos jornais que elas eram a “Quarta Revelação”... Leiamos as considerações de Herculano Pires:

          “O aparecimento em Tóquio de uma edição japonesa do livro Nosso Lar, de André Luiz, leva o confrade Salvador Gentile a reviver, no “Anuário Espírita 1969”, a tese da “revelação luisina”. Essa tese conquistou certa voga no meio espírita (alguns dizem “andréluisina”), mas arrefeceu logo porque Emmanuel e André Luiz foram os primeiros a botar água na fervura. Gentile a ressuscita em termos de revisionismo doutrinário, de “superação” de Kardec, não se esquecendo de criticar “os ortodoxos que fazem de Kardec um dogma intangível”. Respeitar a codificação é ser dogmático, segundo as acusações dos divinistas e outros “renovadores”.

Gentile parte da suposição de que a obra de Kardec ficou em generalidades. Deseja informações particulares, mais concretas, que André Luiz fornece sobre a vida dos Espíritos. Mas se tivessem recorrido ao prefácio de Emmanuel no livro Os Mensageiros veria que essa concretização é simbólica e, portanto, abstrata.

A obra de André Luiz é ilustrativa da revelação espírita, e não propriamente complementar, no sentido de superação que o articulista pretende. É uma grande e bela contribuição nos estudos espíritas, mas sua pedra de toque é a codificação.

O que mais impressionou a Gentile foi a “revelação” de cidades espirituais no espaço. Mas a Bíblia já nos falava da Jerusalém Celeste e as revelações antigas estão cheias de ideias semelhantes. Tratam-se de planos ainda materializados da vida espiritual e não dos planos superiores.

A Revista Espírita apresenta numerosos relatos dessa vida que se assemelha à terrena. Mas Gentile vai mais longe e afirma que certos conceitos de Kardec são reformulados em Nosso Lar, por exemplo: o conceito de Espíritos errantes, o de acampamento, o de perispírito sem órgãos de tipo material. A crítica de Gentile a esses conceitos não tem razão.

Kardec explica no item 226 de O Livro dos Espíritos que são errantes todos os espíritos que ainda terão de reencarnar-se, mesmo os mais evoluídos. A erraticidade não implica apenas a permanência em planos inferiores, mas uma condição do espírito em seu processo evolutivo. Trata-se de um conceito relativo, ou seja, que diz respeito à relação do espírito com a sua passagem pelas fases inferiores da encarnação terrena.

O conceito ou a noção de acampamento não tem em Kardec a aplicação que Gentile lhe deu. Refere-se aos mundos transitórios e não aos planos espirituais.

O de perispírito sem órgãos físicos, que não necessita de restauração de suas forças, é também relativo e está bem explicado no item 254, onde se lê isto, em letras de forma: “A espécie de fadiga que os espíritos podem provar está na razão da sua inferioridade, pois quanto mais se elevam, de menos repouso necessitam”. Partindo de premissas falsas, o articulista só poderia chegar a conclusões falsas.

Não há nenhuma razão para se falar em “revelação luisina”, mesmo porque a própria tese de Kardec é a da revelação contínua a partir da aceitação e do conhecimento da mediunidade.

Antes de pensar em “novas revelações”, o que precisamos com urgência é de estudo sistemático e mais aprofundado da obra de Kardec, incluindo não só os tomos da Codificação, mas também a Revista Espírita, por ele mesmo indicada como indispensável ao bom conhecimento da doutrina.”

 

Fonte

RIZZINI, Jorge. J. Herculano Pires, o Apóstolo de Kardec: o homem, a vida e a obra. São Paulo: Paideia, 2001.


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