terça-feira, 18 de agosto de 2020

Julgamentos morais: ainda sobre o aborto

 


Julgamentos morais: ainda sobre o aborto 


Marco Milani 

          Em um mundo de expiações e provas, não precisamos procurar muito para nos depararmos com os chamados escândalos, aqui entendidos como sendo todos os acontecimentos que se tornam públicos e provocam intensos debates morais e legais, geralmente por contrariarem condutas esperadas ou desejadas em determinado contexto.

A reflexão contribui para a pertinente discussão sobre os princípios e valores de uma sociedade e expõe, rudemente, os problemas e desafios que devemos superar.

Muitas pessoas são movidas pela sincera intenção de expressar a sua visão de mundo e como esse deveria ser, porém, outras buscam explorar os fatos, sejam esses quais forem, com suas calculadas narrativas, objetivando persuadir e convencer o maior número de indivíduos a abraçarem as suas convicções pessoais e, até, bandeiras político-ideológicas.

O recente caso envolvendo o estupro crônico de vulnerável com a consequente gravidez, ainda que não seja incomum, certamente choca e desperta o recorrente debate sobre a pertinência ou não da interrupção provocada da gestação.

O relativismo moral, tão marcante em ideologias materialistas, já tem o discurso pró-abortivo pronto. Sob a perspectiva espírita, por sua vez, a posição pró-vida é nítida, ressalvando-se a situação em que a mãe corra o risco de morrer mediante a continuidade da gravidez, conforme encontramos na questão nº 359, de O Livro dos Espíritos, por Allan Kardec.

Não se pode esperar que materialistas acreditem ou confiem na Justiça Divina, pois a estreiteza de visão desconsidera a realidade espiritual e considera apenas uma existência terrena sem a mínima noção da harmonia natural que regula as relações humanas e a jornada evolutiva dos seres. Tipicamente, a histeria materialista manifesta-se contra todos aqueles que não compactuam com as mesmas opiniões limitadas, supondo que o aborto representaria um alívio perante a expectativa de uma vida mundana eivada de dor e sofrimentos pela maternidade indesejada.

Igualmente, o fanatismo religioso direciona a sua fúria aos descrentes que não se servem dos mesmos argumentos de autoridade supostamente divinos, gerando um conflito de extremistas que não conseguem dialogar e muito menos avançar quanto ao conhecimento baseado nos fatos e na razão.

Assim, fanáticos, sejam materialistas ou espiritualistas, tendem a incentivar e promover o linchamento moral dos adversários.

          O ensino dos Espíritos, validado pelo critério da universalidade adotado por Kardec, contrapõe-se naturalmente à posição materialista e afasta-se da fé cega que gera o fanatismo religioso. Ao destacar a liberdade e responsabilidade de cada um perante os próprios atos, não busca forçar comportamentos pela imposição de preceitos dogmáticos, da mesma maneira que não esconde ou relativiza as consequências.

          Sinteticamente, quem compreende o ensino doutrinário espírita sabe que qualquer ato provoca consequências e a gravidade do ato, aliada à intenção e à compreensão dessas consequências, determinará os reflexos. Todos os envolvidos em uma ação violenta contra um encarnado, como no caso de um estupro, ou a um ser em processo de reencarnação, como na interrupção provocada de uma gravidez, responderão à própria consciência perante as Leis Naturais e não se eximirão dessa responsabilidade.

       Religiosos e materialistas exaltados que tentam se sentir melhor por “lutarem” pela imposição de sua visão limitada de mundo, também trilham os próprios caminhos educativos e rumam ao progresso espiritual, mas não é por isso que deixarão de ser julgados com a mesma intensidade que estigmatizarem e condenarem o próximo.



3 comentários:

  1. Que vom poder ler um texto assim! Obrigado pela objetividade e clareza, tão necessárias nestea dias.

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  2. Muito triste toda essa situação, mas a menina vai precisar de ajuda, afim de superar esse acontecimento. Que Deus a abençoe e a fortaleça na fé e no perdão.

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  3. Decisão difícil, porque há escrúpulos justificáveis tanto para materialistas como para espiritualistas.
    A família poderia intervir contra o aborto, mas qual seria a justificativa plausível, se durante todo processo de violência sexual, nada fizeram diante do mal escancarado diante de seus olhos? O poder do bem era prerrogativa, muito antes desta tragedia... a lei humana decidiu a favor da única que durante todo processo, não foi ouvida e protegida e a escutando, pelos seus motivos, decide acatar sua vontade, estimulada por especialistas da área, determinando que sua decisão era soberana e seu direito inalienável.
    Censurem os extremistas radicais espiritualistas, mas tratando-se da dor profunda entranhada na alma da criança, independente se se justifica perante a lei de expiação, o aborto neste caso, com o aval da justiça humana, foi a melhor medida para amenizar a dor e o sofrimento, de quem ainda terá um longo caminho de reabilitação mental, espiritual e emocional. Por que esta concordância? Simples: porque me coloquei em seu lugar e senti a dor de sua alma... gestação nestas condições e nascimento aumentariam em muito o sofrimento da menina e do reencarnante... tudo isto é fruto da perversidade humana, que permitiu tamanha violência. Ainda para nosso grau evolutivo: um mal menor para evitar um mal maior...

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